depoimentos

André Neiva

A primeira coisa que me vem a cabeça quando penso no Nico é a saudade do tempo em que estudava 10 horam por dia para "tentar"chegar ao nivel musical desse mestre.

Na época que o conheci, não havia internet ainda e para se ter acesso a um material mais aprofundado, tanto de livros quanto de cds, tinhamos que buscar isso fora do Brasil. Eu preferi buscar aqui mesmo,visto que tinhamos aqui um dos melhores baixistas do mundo (Nico, claro). Eu fui a uns 50 ou mais shows em que ele tocou e isso foi sem dúvida, minha maior influencia, "ve-lo tocar"

Fui a mais de 50 shows onde havia a participação dele, mas um que gostei muito, foi no antigo bar People, no Leblon. Era a nata da musica intrumental no palco e Nico encabeçava este show, onde dividia o palco com Carlos Bala, Marcio Montarroyos, Leo Gandelman, Marinho Boffa, Ricardo Silveira, fora as canjas. Lembro -me que cheguei em casa aquele dia por volta das 2:00 da manhã e comecei a estudar e só parei as 2:00 da tarde. Eu levava, o que na época chamávamos "carinhosamente" de "rouba frase". Era um gravadorzinho desses de bolso, onde registrava os solos dele e depois estudava, estudava, estudava...

Vários foram os legados do Nico no que diz respeito a música, mas acho que o mais importante foi ter aberto, para nós que estávamos chegando, uma imensa porta de oportunidades no cenário artistico. Agora, um dos solos mais brilhantes na minha opinião, foi o da musica "Quebra Pedra", do disco do Victor Bilgione. E saber que este solo foi gravado onde hoje é meu estudio, prá mim isso é um grande orgulho. Ainda também um dos discos que mais estudei o "Hi Life".

Ouvi o Nico tocar muitas vezes antes de conhecê-lo. Por coincidência havia um garçom que trabalhava no bar onde eu tocava e que também trabalhava no antigo Jazzmania, onde tocava o Nico. Pedi então para que ele nos apresentasse e assim ele o fez numa oportunidade no próprio Jazzmania.

O que sempre me chamou a atenção no Nico, além da questão musical é claro, era o fato de ele ter sido um inovador. Sua autocrítica o levava a superar-se cada vez mais, sendo este um dos motivos que o fizeram um dos maiores baixistas do mundo. Quanto à parte pessoal, Nico era uma pessoa de caráter admirável e com uma personalidade muito forte. Aprendi muito com ele. Minha relação com o Nico foi muito forte pois ele era, e ainda é, a minha grade fonte de inspiração para compor, improvisar e tocar. Seu exemplo de ser humano me ajudou muito na formação de meu caráter profissional. As aulas com o Nico iam além das didáticas do instrumento. Aprendi muitas coisas com relação a comportamento, horários, como agir profissionalmente diante de certas situações, entre outras. Lembro-me dele com muita saudade e com grande respeito. Fizemos há algum tempo, a convite de sua viúva, Rossana, um tributo ao Nico tocando apenas músicas dele. Éramos eu, Cláudio Infante (bateria), Nelson Faria (guitarra) e Afonso Cláudio (sax). Para mim, fazer um tributo ao Nico significa representá-lo ali na hora do show e isso é uma responsabilidade muito grande, pois até a mãe dele estava lá. Espero ter cumprido bem meu papel. Ele ainda está presente em minha música e acho que vai ficar para sempre, por isso lembro-me dele sempre que pego meu instrumento.

Voltando ao dia em que conheci o Nico, pedi para fazer uma aula com ele logo de cara, e marcamos então a primeira aula. Eu estava super nervoso pois estava diante de uma pessoa que eu admirava muito e que sabia ser um dos maiores baixistas do mundo. Logo ele começou a tocar. Tocou mais ou menos 20 minutos, me deu o baixo e falou: "agora é você". Vocês podem imaginar como eu fiquei mas não fugi do seu pedido: peguei o baixo e comecei a fazer todas as coisas que já havia aprendido indiretamente com ele e com os vários solos tirados e frases de discos gravados pelo Nico. Antes mesmo de eu acabar ele pegou outro baixo e começamos a tocar juntos, e a aula que era para ser de uma hora ficou em mais ou menos umas 5 horas. Realmente foi inesquecível. Quando nossa “jam” terminou eu lhe disse que queria marcar outra aula e ele me respondeu: "Tudo certo, mas não precisa pagar essa outra aula, pois você me fez lembrar de coisas que eu toquei que nem me lembrava mais. Vem aí!". Eu saí de lá nas nuvens e nem imaginava que ali estaria começando uma grande amizade. Isso foi há 18 anos (que saudade!).

Depois disso minha carreira foi crescendo, graças a Deus, e passei por diversos lugares nos quais ele já havia tocado. O mais significativo foi quando fui chamado pelo João Bosco para tocar com ele. Pensem bem, o Nico tocou com o João 15 anos e eu estava entrando no lugar de um dos maiores do mundo! Que “responsa”! Como um grande mestre ele ainda é e sempre será um exemplo para muitos músicos. Quem não o conheceu "aqui embaixo" e nem à sua obra precisa saber que o Brasil, país que nunca chegou a lhe dar o merecido valor, gerou um dos maiores músicos do mundo. Sua arte não se resumia em tocar maravilhosamente bem. Nico, na verdade, era um gênio.

Valeu, Assumpção, por tudo que você fez pela música!

Curriculum

Nascido no Rio de Janeiro, André Neiva, iniciou seus estudos com o piano clássico, dos 8 aos 12 anos, chegando a fazer 4 concertos na sala Cecília Meireles. Aos 14 anos ganhou um violão de seu pai e estudou até os 16 anos quando resolveu tocar contrabaixo.

Andre NeivaCom 20 anos de estrada, o nome André Neiva aparece em mais de uma centena de discos, tendo trabalhado como produtor, arranjador ou músico ao lado de Gal Costa, João Bosco, Jorge Vercilo, Jorge Aragão,Diogo Nogueira, Baby do Brasil, Tim Maia, Airto Moreira, Flora Purin, Cama de Gato, Tunai, Léo Gandelman, Billy Cobham, Don Grusin, Victor Biglione, Neguinho da Beija-Flor, Dominguinhos do Estácio, Ricardo Silveira, Cristóvão Bastos, Moraes Moreira, Zé Ramalho, Alceu Maia(Choro Elétrico)Jorge Aragão, Blitz, Márcio Montarroyos, entre muitos outros.

Tem uma forte presença na música Gospel tendo gravado com mais de 70 artistas entre eles destaque para: Carlinhos Felix, Eyshila, Jossana Glessa, Cristina Mel, Mara Maravilha, Adilson Silva, Beto Byron, Graça e Paz, etc...

Em 2004, André Neiva lançou seu primeiro vídeo-aula. O primeiro a ser filmado com simulador de película de filme e com um vídeo clipe de bônus. Realiza mais de cinquenta workshops pelo Brasil e no exterior todos os anos.

Em 2010, lançará o CD e o DVD do Cama de Gato, pela sua produtora, a “Beckstudios e N Filmes”.